Falar de ecossistemas digitais é falar das relações e das dinâmicas que se estabelecem nos diferentes ambientes (analógicos e digitais) em que os mesmos se devem complementar. Na minha perspetiva analógico e digital não se substituem, os dois são partes fundamentais do processo. Um pode apoiar o outro e vice-versa. Na prática a riqueza e a mais-valia do processo educativo é a possibilidade do recurso a diferentes estratégias, interações e recursos tecnológicos. Talvez numa lógica de Blended Learning, como referem (Schlemmer e Moreira) 2020 " um conceito de educação caracterizado pelo uso de soluções combinadas ou mistas, envolvendo a interação entre modalidades presencial e à distância, a interação entre abordagens pedagógicas e a interação entre recursos tecnológicos".
Assim, só das inúmeras relações que se vão estabelecendo nestes ecossistemas poderemos falar em educação digital, sendo que para que esta aconteça é importante modificar mentalidades e práticas. Só com essa mudança se poderá melhorar a educação.
O plano de ação para a educação digital refere isso mesmo, uma educação digital que ocorre tendo em conta: as presenças (físicas ou digitais), os tempos (síncronos ou assíncronos), as tecnologias (analógicas ou digitais) e as culturas de base ao processo (digitais ou pré-digitais).
Neste sentido mais do que usar o digital importa refletir sobre o papel dos professores e dos alunos no acesso ao conhecimento e no uso do digital de modo que os processos de aprendizagem sejam enriquecedores, estabelecendo redes de conhecimento, que se melhoram ou intensificam, pela utilização do digital, mas não só. O referencial DigCompEdu remete para isso mesmo.
Como é referido no ebook " Princípios para o design pedagógico em tempos de pandemia" os fatores humanos e não humanos, bióticos e abióticos, remetem que mais importante que o uso das tecnologias é a mudança de práticas pedagógicas que levam a uma educação de sucesso.
O 1º objetivo do Plano para a Educação Digital (2021-2017) remete para a importância das relações que se devem estabelecer entre esses dois fatores e atores (AH e ANH) e para a importância de os ecossistemas digitais terem 3 componentes essenciais: a organizacional, a metodológica e a tecnológica.
Uma abordagem com o intuito de promover uma educação digital passa, também, por promover a implementação de metodologias ativas.
As metodologias ativas têm por base uma aprendizagem ativa em que novos conhecimentos são produzidos/construídos quando os alunos combinam informações com os seus conceitos, conhecimentos ou experiências existentes, através do processo de reflexão. Assim este tipo de metodologia baseia-se na importância de centrar o processo de aprendizagem na colocação do aluno no centro do processo.
O desenvolvimento deste tipo de metodologia apela ao trabalho colaborativo, à produção de recursos educacionais abertos, com a consequente expansão da utilização de documentos com licença aberta (aumentando a rede de recursos disponíveis), promovendo o desenvolvimento do pensamento crítico, a capacidade de autoaprendizagem, de respeito pelo ritmo de cada um e pela flexibilidade da organização dos conteúdos. Este trabalho só é efetivo se forem promovidos momentos de autorregulação que permitam uma avaliação do processo.
A utilização das tecnologias digitais tem aqui potencial pois permite incrementar o uso de estratégias focadas no aluno, centrando o processo nele. Podem ajudar a motivar os alunos, tornar mais diversificados os recursos existentes e permitir a procura de informações que ajudem a construir e a consolidar o conhecimento.
A implementação de metodologias ativas, promovendo as tecnologias digitais permitirá proporcionar acesso a mais informação, promover mais autonomia nos alunos e prepará-los para a entrada no mundo do trabalho com competências necessárias à sua melhor integração profissional. É, também, importante que esta utilização das tecnologias digitais seja orientada de modo que os alunos aprendam a selecionar a informação, bem como a interpretar e a analisar a informação a que têm acesso através do acesso à tecnologia. A sua aplicação permite que se dê uma especial atenção às potencialidades destas ferramentas que visam criar mais oportunidades para que o aluno não seja um mero recetor do conhecimento, mas sim, também ele, um construtor do seu próprio conhecimento.
Esta potencialidade remete para a importância de potenciar as relações já existentes, numa cultura de rede, integrando tudo o que envolve o aluno no processo de ensino-aprendizagem, revestindo-se de máxima importância o fluxo de interações que; de acordo com Schlemmer e Moreira, 2019, vem evidenciar um espaço híbrido em que o fluxo de interações entre os AH e ANH ocorre em espaços digitais e geográficos por meio de tecnologias, sejam elas digitais ou analógicas.
Como enfatizam os respetivos investigadores " A educação é um sistema aberto, não linear e não hierarquizado, por meio do qual as pessoas aprendem em diferentes contextos e espaços, em processos conetivos de interação em rede".
Esta ideia faz-nos tomar consciência de que a educação ocorre em qualquer contexto e situação pois desde que o ator humano, esteja predisposto a isso, é possível criar conhecimento, mesmo que não seja no espaço formal de sala de aula.
Acredito que caminhamos para uma realidade em que o futuro da educação está onlife, onde o primado da aprendizagem tem a tónica nas relações que se estabelecem entre os diferentes intervenientes, sejam elas no campo digital, ou não, e que vão permitir enriquecer o conhecimento. Nesta ótica deixa de fazer sentido a distinção entre offline e online pois a educação dá-se em todos os campos e contextos.
Esta nova realidade é preconizada no documento " The Online Manifesto- Being a Human in a Hyperconneted Era" que remete para o facto de deixar de fazer sentido estabelecer esta diferença.
Na realidade ainda temos alguns passos a dar neste percurso, mas o facto de cada vez mais pessoas se debruçarem sobre este tema e o trazerem para a discussão pública, vem ajudar a que se reflita sobre o mesmo e sobre a necessidade de mudar mentalidades e práticas educativas.
Moreira e Schlemmer (2020), defendem, como um novo conceito e paradigma de educação: que denominam de Educação Digital Onlife e que de acordo com os investigadores se pode entender do seguinte modo: " A educação digital é compreendida, então, por processos de ensino e de aprendizagem que se constituem no coengendramento com diferentes TD (tecnologias digitais), que podem ou não estar interligadas por redes de comunicação."
Neste sentido e nesta linha de pensamento este novo paradigma remete-nos para uma nova forma de formar professores, para a mudança das metodologias e das práticas pedagógicas de modo que que sejam mais articuladas com a realidade atual, em que é necessário promover processos que permitam apropriar os novos conhecimentos de modo sustentado e credível.
Este pensar a educação de uma forma digital baseia-se numa mudança na forma de pensar da tutela e dos próprios professores. É importante que os professores passem a trabalhar de forma colaborativo e deixem de " fechar" a porta da sala. Só das interações que se estabelecem será possível criar dinâmicas novas que levem ao desenvolvimento de uma nova ecologia educativa. Como é referido, por Moreira et al, (2020), " O desafio passa pela criação de ambientes férteis , dinâmicos, vivos e diversificados onde o conhecimento, as ideias e o espírito empreendedor possam nascer, crescer e evoluir." Deste modo é necessário investir em processos pedagógicos diferentes em que o papel do professor e dos alunos deve ser repensado e o modo como se integram as diferentes metodologias no dia-a-dia dos alunos também.
Lucas, M., & Moreira, A. (2018). DigCompEdu: quadro europeu de competência digital para educadores. Aveiro: UA
Martins, G. et al (2017) Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória, Ministério da Educação/Direção Geral da Educação (DGE), Editorial do Ministério da Educação
Moreira, J. A., Henriques, S., Barros, D., Goulão, F., & Caeiro, D. (2020). Educação Digital em Rede: Princípios para o Design Pedagógico em Tempos de Pandemia. Coleção Educação a Distância e eLearning. Lisboa: Edições Universidade Aberta.
Moreira, J. A. (2020). Era Híbrida, Educação Disruptiva e Ambientes de Aprendizagem.
Moreira, J.;Schlemmer, E.. Por um novo conceito e paradigma de educação digital onlife, v.20, Revista UFG
