Este blog tem como objetivo documentar a aventura que será frequentar este mestrado

quinta-feira, 16 de dezembro de 2021

Autenticidade e Transparência na Rede




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Falar de autenticidade[1]  e transparência[2] é falar, de acordo com o dicionário, da qualidade do que é ser autêntico, verdadeiro; e qualidade do que é ser transparente e que vem do radical transpar (ecer), que nos remete para algo límpido. Mas será possível usar estes dois termos quando nos referimos à comunicação e ao uso da rede.

Segundo Castells uma sociedade em rede é o resultado das relações que se estabelecem entre o social, o económico e o moral. Deste jogo de forças organiza-se a rede, que não são mais do que as ligações que promovem a interdependência entre todos os que a utilizam e se ligam virtualmente. Neste sentido, Lévy defende que a rede se organiza num mundo digital em que parte da realidade, do mundo da significação se funde com o mundo virtual. Logo, o ciberespaço, onde se desenvolve a rede, é um meio de interconexão mundial em que cada um pode assumir diferentes papéis. Por este motivo, organiza-se como um sistema aberto em que há uma mudança constante, e em que os significados fazem parte do simbólico e da sua relação com o real.

Já Baudrillard vem referir que é quase impossível separar o mundo real do mundo virtual pois, estamos num mundo hiper-real em que o excesso de informação nos deixa “ desinformados”. Neste sentido, Baudrillard refere que vivemos numa simulação em que temos uma presença ausente, pois ao criarmos uma imagem nem sempre a mesma corresponde à realidade.

Estas ideias levam-nos a refletir sobre a nossa identidade virtual vs a nossa identidade privada. Será que é o mesmo? Será que fazemos usos diferentes da nossa identidade? Ou será que temos diferentes identidades? Será a nossa identidade virtual um prolongamento da nossa identidade pessoal?

A falta de verificabilidade física, de uma entidade que faça a validação, no mundo virtual ou de ligação à rede, leva a que possa existir uma manipulação, uma criação de uma identidade que não corresponda à identidade pessoal, mas sim à identidade que eu gostaria de ter, e que crio quando me ligo na rede.

Assim, as identidades que se criam no acesso à rede, por não terem uma entidade “fiscalizadora” ou de validação, permitem que se possam falsear informações. Deste modo, e como a rede é construída pelas informações que cada um coloca sobre si, a mesma pode não corresponder à verdade.

A identidade virtual resulta do que definimos como “verdadeiro” na rede, e nesse campo nos define, mas que pode estar desfasado da realidade. No digital temos a possibilidade de direcionar os outros para uma imagem de nós, que pode não corresponder à realidade. Assim falar de autenticidade e transparência na rede não é passível de se assumir como fácil.

A verdade é que a internet ( a rede) quando usada sem autenticidade permite criar um “ eu” à semelhança do que idealizamos para nós e que pode não corresponder ao real. A rede passa então a ser um facilitador de fraude, uma vez que não há validação destes dados. Esta autenticidade e transparência está intimamente ligada à capacidade que cada um tem de usar a sua liberdade para não enganar/defraudar os outros. Esta realidade vai ao encontro de algumas das ideias de Baudrillard que defendia que a realidade deixa de ser a mesma, passando a ser um simulacro, uma simulação, em que o real é substituído pelos seus signos. De acordo com esta perspetiva, há uma mistura entre a identidade virtual e a identidade pessoal, que se refere ao modo como nos posicionamos e identificamos na rede e que interfere, ou tem repercussões, no modo como vivemos na realidade e nas conexões que estabelecemos fora da rede.

Como refere Lévy, não é possível separar o virtual do real, pois estes dois “mundos” complementam-se e relacionam-se influenciado as relações dentro e fora de cada um deles.

Tal como na vida real, a vida virtual passa pela noção que cada um tem do modo como quer conduzir a sua conduta perante os outros. Se a nossa perspetiva é de autenticidade e transparência, as informações que colocamos na rede vão estar de acordo com esses princípios; por outro lado se o nosso intuito é “criar” uma personagem para “habitar” uma rede que satisfaça o “meu ideal”, então o uso de autenticidade e transparência pode estar comprometido.

Importa, no entanto, refletir sobre: 

Será que na vida real a nossa identidade é sempre a mesma? Ou será que também a moldamos em função dos contextos em que nos encontramos?



Referências Bibliográficas 

Baudrillard, J. (2001) Simulacros e Simulação. 2a edição. Lisboa: Relógio d’Água.

 Castells, (2006) “Informacionalismo, redes y sociedad red. Una propuesta teórica”. In Castells, M. (ed.) La sociedad Red. Una visión global. Madrid: Alianza. (2006) “Informacionalismo, redes y sociedad red. Una propuesta teórica”. In Castells, M. (ed.) La sociedad Red. Una visión global. Madrid: Alianza

 Lévy, P. (2000) Cibercultura. Lisboa: Piaget.  

 



[2]https://dicionario.priberam.org/transpar%C3%AAncia 

domingo, 12 de dezembro de 2021





Baudrillard VS Virilio

O sentido da revolução tecnológica 

 Uma parte significativa dos teóricos da sociedade da informação parece partilhar da convicção de que as novas tecnologias da informação e comunicação se afirmarão como uma indiscutível mais-valia, nomeadamente porque contribuirão para o acréscimo do conhecimento. Porém nem todos partilham desse otimismo, sendo que há pensadores que levantam questões e revelam uma preocupação crescente sobre o destino a que, de facto, a revolução tecnológica nos conduz.

Lançada, então, a questão sobre o sentido desta transformação social causada pela revolução tecnológica, nomeadamente na tentativa de compreender e antecipar o destino a que ela nos conduz, procurou-se interpretar as visões quer de J. Baudrillard, quer de P. Virilio.

Nesse sentido, parece oportuno encontrar respostas a algumas perguntas, que podem ser entendidas como eixos estruturantes do pensamento sobre esta nova realidade: para que riscos concretos alertam um e outro? Que tempo exploram? Olharão ambos o presente? Ou o futuro? O que teme Virilio? Para ele, a revolução tecnológica conduzirá inevitavelmente à catástrofe? E o que constata Baudrillard? Que alteração julga ele verificar na forma como se altera o mundo da significação nesta nossa relação com o virtual? Como concebem a tecnologia? Será ela boa ou má? E, para além daquilo que os poderá separar, não haverá também pontos de contacto? E, finalmente, será, de facto, possível rotular estes autores de pessimista e otimista?

Assim, e na certeza de que ambos os pensadores claramente parecem preocupados com as consequências da utilização dos media e das novas tecnologias para a sociedade, parece notar-se que Baudrillard, numa primeira fase, se mostrou profundamente crítico face ao mundo da publicidade e do marketing. Considerava ele que o mundo aí representado era uma construção que chocava violentamente com a realidade e que quebrava as pontes naturais do homem com os seus pares. Estava ele, então, bastante próximo do Marxismo nessa sua atitude condenatória do Capitalismo e das estratégias que conduzem ao consumismo desenfreado.

Por outro lado, numa fase posterior e obviamente mais recente, afastou-se desse pensamento pessimista e adotou um outro mais neutro, aceitando que a hiper-realidade, a tal da esfera da cibercultura, é afinal uma realidade per si, que nada representa e que vale pelo que é.

Já na visão de Virilio, o progresso é, de certa forma, um paradoxo, porquanto não traz apenas o sucesso, como também a inevitável tragédia e que isso poderá conduzir a Humanidade à catástrofe.

Afirma ele que o ritmo vertiginoso atual do progresso tecnológico obriga a Humanidade a delegar na máquina o poder de decidir e agir. E essas decisões e ações já não decorrem da experiência do passado nem da reflexão demorada, antes se limitam a acontecer no instante. E isto porque é tanta a informação e que ela nos atropela a uma velocidade tal, que somos incapazes de a processar, perdendo-se sobre ela o controlo.

Diz ele, olhando o Futuro construído em torno das novas tecnologias, temer a desgraça, pois que a Humanidade se arrisca a encontrar um final dramático, caso prossiga neste caminhar cada vez mais veloz, delegando na máquina o que devia ser seu, logo perdendo o norte.

Por outro lado, e ainda que Baudrillard tema a impossibilidade de interpretar o mundo em consequência da revolução tecnológica, até porque a ausência de referências transportadas do passado poderá conduzir à perda de valores e certezas, não acreditava ele que a dita revolução conduzisse à catástrofe.

Antes alerta para o facto de se estar a perder a noção do real, daquele que é verdadeiramente o seu significado, na medida em que o facto de se reproduzir tantas vezes um objeto faz com que o mesmo perca o seu real sentido e se torne impossível conhecer a realidade tal como ela é, passando a conhecer-se apenas o modo como ela é reproduzida sucessivamente. Conclui que, quando existe muita informação, deixa de ser possível perceber a "verdadeira" informação, dizendo que "Com o desenvolvimento das autoestradas da informação, estamos diante de um novo fenómeno: a desorientação." (Simulacros e Simulação, p. 197)

Já Virilio alerta para os riscos de um Futuro em que o Homem pode perder a real ligação consigo e tornar-se apenas num ser virtual - "O século XXI será a desorientação, quer dizer, a perda de todas as referências – se a humanidade continuar desse jeito, e ela não continuará. Portanto, eu não creio de maneira alguma no fim do mundo. Mas o que eu quero dizer é a desorientação: não sabemos mais onde estamos nem no espaço nem no tempo." (Entrevista de Virilio ao Le Monde Diplomatique, traduzida e publicada no Diário Liberdade a 15 junho de 2011)

Assim, P. Virilio, enquanto filósofo, sociólogo e urbanista, refletiu sobre as questões da tecnologia e da sua evolução, destacando, sobretudo, uma reflexão no que diz respeito à velocidade, ao poder e futuro da sociedade e do mundo neste progresso abrupto.

Na verdade, revela ele uma grande preocupação com o efeito que a globalização e a desmaterialização da comunicação ao nível do espaço e do tempo possam repercutir no futuro da sociedade e na vida sedentária dos seus indivíduos. É de salientar, em todo o caso, que Paul Virilio não é contra o progresso, mas apenas que se não deixa levar pelo positivismo desmedido de que estas evoluções são todas boas e levarão à resolução dos problemas, levando a um mundo de felicidade.

Ele anuncia claramente que toda a criação/evolução terá os seus percalços e acidentes, tal como expõe na seguinte afirmação: “Nesta linha de pensamento, consideramos que cada período da evolução/inovação técnica trouxe a evolução de acidentes específicos: criar o navio foi inventar o naufrágio, descobrir a máquina a vapor, a locomotora, e outros, abriu a possibilidade de descarrilamento. Com a invenção da aviação emerge a catástrofe aérea, o choque contra o solo. O mesmo se aplica ao automóvel com a colisão em série a grande velocidade... Analisando a negatividade do acidente de um objecto pode-se, apesar de tudo, desenvolver esse mesmo objecto para o aperfeiçoamento, para o humanizar e o civilizar.” (PDF) "A Sociedade dos media: Comunicação e Tecnologias da Informação e Comunicação em Paul Virilio". Available from: https://www.researchgate.net/publication/291505858_A_Sociedade_dos_media_Comunicacao_e_Tecnologias_da_Informacao_e_Comunicacao_em_Paul_Virilio [accessed Nov 24 202].”

Por isso a sua crítica vem apelar a uma busca de entendimento dos aspetos negativos que podem ocorrer dessa evolução, de forma a atingir um aperfeiçoamos do sistema e das nossas respostas e para entrarmos na evolução de forma consciente e não destrutiva dos valores e democracias da sociedade.

Virilio considera, ainda, que “as novas tecnologias geradas por uma velocidade supersónica dos meios de comunicação remetem-nos a uma inércia domiciliária, a um sedentarismo terminal e definitivo.” (Virilio apud Ungaro, 2003: 7-8), (PDF) "A Sociedade dos media: Comunicação e Tecnologias da Informação e Comunicação em Paul Virilio". Available from: https://www.researchgate.net/publication/291505858_A_Sociedade_dos_media_Comunicacao_e_Tecnologias_da_Informacao_e_Comunicacao_em_Paul_Virilio [accessed Nov 24 202].”

Portanto, as nossas relações atuais, sociais, profissionais, conjuntamente com a nossa própria inteligência, com a noção temporal e de espaço, estão já vinculadas à tecnologia do relógio, dos meios de transporte e de comunicação. Este último ponto é o que desperta atualmente mais interesse, uma vez que se encontra em permanente mudança, de uma forma vertiginosa, que altera comportamentos e valores da sociedade em que estamos inseridos e que nos remete a uma desorientação de distância em relação ao outro e ao mundo.

Assim, se as tecnologias de informação e comunicação acrescentaram significados novos ao nosso mundo virtual linguístico e semântico, por outro lado vieram alterar conceitos, fazendo com que alguns perdessem o seu significado, tais como os decorrem da relação dual presença e ausência, do orgânico e inorgânico, matéria/real e virtual/simulacro, próximo e longínquo.

De facto, Virilio não recusa a ideia de que, mesmo com todos os avanços tecnológicos, houve uma regressão ou até uma certa atrofia dos movimentos humanos. Afinal, os meios de comunicação desenvolvidos para nos ajudar a comunicar são também eles meios de acentuar a solidão física e o afastamento social. As câmaras que inventamos são como próteses ao nosso olhar e as invenções que nos fizeram criar os transportes para irmos mais longe e nos conectar são suprimidas pelas tecnologias como a televisão, que nos levam a ver o mundo de forma fixa e desconectada.

Efetivamente, e dependendo do seu uso, qualquer evolução pode acrescentar ou retirar valor. O ponto fulcral de preocupação é termos a capacidade intelectual de entender o quanto uma evolução começa a deteriorar uma sociedade, em vez de a enaltecer, e consequentemente de nos prevenir para este facto.

Porém, não há dúvidas de que o ser humano se encontra cada vez mais dependente das tecnologias para se validar e ter o sentimento de pertença dentro de uma sociedade, procurando, nestes meios de entretenimento e lazer, cultura, aprendizagens, sociabilização e validação de sentimentos e ações.

Ressalva-se o facto de como, atualmente, a própria personificação aderente aos nossos serviços nos mantém prisioneiros do nosso próprio ego, impossibilitando-nos de ver mais além daquilo que nos é transmitido ou baseado no nosso gosto atual. A nossa janela é cheia daquilo que a nossa comunidade de referência virtual nos faz consumir. Estamos de certa forma agregados a um comodismo e sedentarismo.

Já Baudrillard defende que a individualidade no mundo atual é um mito, uma ilusão. As pessoas são unidades que refletem o que está a acontecer nos meios de comunicação. O seu objetivo é consumir imagens e sinais.

Baudrillard desenvolveu teorias sobre o impacto da comunicação e dos media nas sociedades e na cultura contemporânea. Baseou a sua filosofia no conceito de virtualidade do mundo aparente, refutando o pensamento científico tradicional. Criticava a sociedade de consumo e os meios de comunicação, considerava as massas cúmplices dessa situação. Para ele os objetos não possuíam apenas um valor de uso e um valor de troca, mas também o valor de signo.

Afirma que o sistema tecnológico desenvolvido e a quantidade de informações influenciam na definição da massa crítica. Assim a máquina representa o homem que se torna um elemento virtual deste sistema. Se considerarmos que o real é tudo o que fazemos fora da rede, e o virtual compreende as nossas atividades online, necessitando para isso de estarmos conectados, percebemos que, nesta altura e na nossa sociedade, é impossível separar o mundo real do mundo virtual. O virtual só pode existir a partir do momento em que o real existe e os dois são inseparáveis, sendo exemplo disso o filme “Matrix”, baseado parcialmente no seu livro Simulacros e Simulações.

Percebe que o excesso de informação que recebemos não nos deixa verdadeiramente informados, mas sim impotentes. Para este filósofo, estamos atualmente num mundo hiper real. A visão de Baudrillard poderá ser mais generalista, considerando que o público-alvo dos meios de comunicação se divide entre os que são facilmente influenciáveis e os que são mais críticos.

Segundo este filósofo, a simulação é fingir uma presença ausente, criar uma imagem sem que a mesma corresponda à realidade. Esta definição encaixa, segundo ele, na publicidade e nas imagens que são veiculadas pelos meios de comunicação, logo os meios de comunicação impedem qualquer interpretação fiável sobre o que nos rodeia. Ademais, este pensador explora o presente, o momento atual, considerando que há uma perda de sentido e que a sociedade poderá ser absorvida pelo mundo virtual.

Esta situação é provocada pelos meios de comunicação, porque há tanto a reprodução de um objeto, que o mesmo fica afastado do verdadeiro. Existem muitas informações, o que faz com que não seja possível perceber a verdadeira realidade. Os meios de comunicação simplificaram tanto as coisas, que fazem com que a verdadeira realidade se perca. Segundo Baudrillard, perde-se a complexidade da realidade.

Regressando à questão sobre como concretizam e descrevem a relação do homem com o mundo virtual e sobre o modo como interagimos com ele, o mundo tecnológico, e o papel que nele assumimos, é de recordar que Virilio efetua muitas das suas críticas assentes em conceitos como o tempo/velocidade e o poder.

Virilio aponta que na nossa idolatria do progresso, a velocidade é o aspecto que se encontra escondido pela riqueza e pelo poder agregados à noção de progresso, sendo que, por norma, a promoção do progresso é feita ocultando os acidentes que estes mesmos criam. Para Virilio, um desses grandes acidentes é vivermos a uma velocidade estonteante, num tempo instantâneo, onde, na verdade, o tempo nos foge. O tempo humano é ultrapassado pelo tempo-máquina e o nosso poder é delegado de forma inconsciente nas máquinas e nas tecnologias.

Atualmente, o poder sofreu uma transferência de localização. A guerra pelo poder geopolítico é substituída/transferida para o poder geopolítico, onde as “ondas” e os satélites têm o protagonismo. Mais, existe uma guerra oculta pela informação, onde aquele que partilhar mais informação ou a venda tem mais poder. Temos o caso do Facebook, cujo poder e riqueza é sustentada pela quantidade de informação gerada e partilhada, assim como pelo espaço abstrato e conceito intemporal do mesmo. Esta própria transferência de poder vem agregada ao descontínuo do conceito espaço, uma vez que as tecnologias nos trazem os espaços virtuais, os espaços desvinculados do elemento físico.

Estas questões impactam o ser humano ao nível dos seus comportamentos, traços de personalidades e noções, e causam uma desconstrução da cultura. Por exemplo, a aceleração do tempo e o espaço virtual podem pôr em causa a percepção do mundo e a empatia entre seres humanos.

Com esta desvinculação espaço-temporal e transferências de poder para as máquinas e a sua informação, o ser humano vive preso a uma teia de imediatismo, do mediatismo, e ainda numa sincronização de emoções, que nos pode roubar, de certa forma, a voz que pensamos adquirir. De facto, “A globalização gera um sentimento de claustrofobia da humanidade, a Terra é muito pequena para a revolução das telecomunicações, nós também vivemos de distâncias, vivemos, por isso, um sentimento de encarceramento. (https://observador.pt/opiniao/paul-virilio-os-tempos-que-o-tempo-tem/)

Portanto,  Virilio não considera a eliminação da internet e da cibernética, mas sugere que elas sejam utilizadas de forma civilizada. Ele afirma que estar na retaguarda dos progressos e novas dinâmicas é uma obrigação dos pensadores dedicados nas lutas por um mundo melhor.

Paul Virilio, no seu livro Inércia Polar, demonstra vários dos aspetos da nossa interação com as tecnologias e de como isso nos altera, destacando-se:

- "As funções domésticas, antes distribuídas pelas diversas habitações e que envolviam deslocações, encontra-se agora condensadas num único local, num "tele-comando"." Esta situação é evidente nos dias de hoje, pois há imensos eletrodomésticos inteligentes e programáveis, que estão a um clique do smartphone... aliás, tudo é SMART nos dias de hoje. Isto leva a menos deslocações e a vivermos num centro de inércia, pois é possível, nas palavras de Virilio, "Reunir-se à distância", onde o utente vive num lugar de comodidade absoluta, onde, num único local, reúne tudo aquilo que se encontrava afastado.

A nossa possibilidade de controlar o nosso ambiente em "tempo real" leva a que, como já dizia Joseph Roth, em 1927, "Estamos tão perto das coisas que elas já não nos tocam sequer". Este avanço detém-se não só na questão dos eletrodomésticos e no controlo do ambiente, mas também nas conexões interpessoais. Quanto casos não testemunhamos de duas pessoas na mesma divisão a trocarem mensagens via telemóvel? Quantas pessoas virtualizam as suas emoções ou ações afetuosas por emoji?

Este aspecto do controlo do ambiente via distância, graças a um "servo-motor que funciona sem fios e a altas-frequências", demonstra que o "ser presente já não está propriamente no aqui e agora, está em potência. Em "potência", isto é, em velocidade absoluta".

Além de um cúmulo do conforto doméstico, este sistema integrado, que permite, de uma forma simples, controlar, com um só equipamento, tudo o que diz respeito a uma habitação (domótica), representa um acidente específico (risco), que equivale a uma "paralisia voluntária". Com este controlo já não está em causa a alteração de um gesto familiar (como acender a luz ou aspirar), mas a ergonomia comportamental no seu conjunto, excetuando as ações de comer, lavar, vestir e ir à casa-de-banho.

- O domínio exclusivo do meio de telecomunicações será a era da imobilidade e da inércia domiciliária.

- Passaremos a morar em toda a parte, através da imagem e da velocidade audiovisual, que trará impactos ao nível a reforma arquitectónica e urbanista das cidades. 

- Por fim, destaca-se o alerta de Virilio para o facto de vivermos num lugar de espectador armadilhado, cuja "percepção é antecipadamente programada pela potência de cálculo do motor de inferência do computador".

Por seu lado, Baudrillard considera ou denomina a sociedade em que vivemos de hiper-realidade, afirmando que é muito difícil separar o mundo real do mundo virtual, até porque muitas das atividades que fazemos no mundo real se fazem através do mundo virtual. Baudrillard dá como exemplos as transferências e pagamentos online. Logo, este filósofo considera que o mundo virtual está a exterminar o mundo real. Portanto, neste momento a hiper-realidade acontece, porque já não é possível dissociar um mundo de outro.

“(...) A extensão incondicional do virtual (que não inclui somente as novas imagens ou a simulação a distância, mas todo o ciberespaço da geofinança (Ignacio Ramonet) e o da multimídia e das autoestradas da informação) determina a desertificação sem precedentes do espaço real e de tudo o que nos cerca. Isso valerá para as auto-estradas da informação e também para as de circulação. Anulação da paisagem, desertificação do território, abolição das distinções reais. O que até agora se limita ao físico e ao geográfico, no caso de nossas auto-estradas, tomará toda a sua dimensão no campo eletrónico com a abolição das distâncias mentais e a compressão absoluta do tempo.(...) Podemos nos perguntar de resto se já não ultrapassamos esse limiar (do fenómeno da massa crítica) e se a catástrofe da informação já não ocorreu, na medida em que a profusão multimediática de dados se auto-anula e que o balanço em termos de substância objetiva da informação já é negativo. Há um precedente com o social: o patamar da massa social crítica já está amplamente ultrapassado com a expansão populacional, das redes de controle, de socialização, de comunicação, de interatividade, com a extrapolação do social-total – provocando desde agora a implosão da esfera real do social e de seu conceito. Quando tudo é social, súbito nada mais o é.” (Jean Baudrillard, 1997:24,25)

O que o filósofo pretende enfatizar é que, pelo facto de se veicularem, vezes sem conta, as mesmas informações, estas perdem o seu real significado, pois acabam distorcidas e sem valor. A capacidade comunicativa e a televisão é considerada a principal responsável por esta situação.

Para Baudrillard o virtual esvazia de sentido o real, pois não se consegue diferenciar um de outro.

“A potência do “virtual” nada mais é do que virtual. Por isso, aliás, pode intensificar-se de maneira alucinante e, sempre mais longe do mundo dito “real”, perder ela mesma todo princípio de realidade. (...) Mesmo os capitais especulativos não saem quase da própria órbita: amontoam-se e não sabem sequer onde se perder no próprio vazio especulativo.” (Jean Baudrillard, 1997:26)

Finalmente, e ainda que ambos os pensadores pareçam recuar ao passado para nele encontrar a génese do mundo tecnológico e das transformações sociais que dele decorrem, surge a questão sobre se ambos exploram de facto o mesmo tempo? Será que as preocupações se centram de igual forma no presente e também no futuro? Ou haverá aí uma diferença que os afaste, de facto?

Assim, Virilio tem uma noção de tempo que parece ultrapassar as próprias noções de presente e futuro. O problema dos avanços tecnológicos causou uma certa disrupção no tempo. O tempo deixou de ser mensurável por anos, meses e dias, e tornou-se algo ditado pela velocidade (alucinação do tempo) e pelo "tempo que se expõe". Não existe uma linearidade habitual da história, mas o "tempo da alta definição vídeo-infográfica de uma representação de "tempo-real" das aparências que abole a própria utilidade da óptica passiva, em proveito da óptica ativa." (Livro "A Inércia Polar" de Paul Virilio, ppg. 93-94)

Virilio interpreta mais o tempo por uma questão de velocidade. Na verdade, refere que caminhamos para uma progressiva negação do intervalo de tempo, com a "retenção acelerada do tempo de passagem que separa a partida da chegada."

"A distância espacial cede subitamente o lugar à mera distância no tempo, passando as mais longínquas viagens a ser pouco mais do que breves intervalos." -> Velocidade

Apesar de, neste caso, Virilio estar a retratar a questão dos veículos, este tópico também é bastante verdadeiro nos consumos da internet, em que esperamos que qualquer pesquisa chegue numa questão de microssegundos. Assim o que se torna relevante é a velocidade e a potência, e não o tempo e a distância. O tempo é irrelevante face à alusão de velocidade.

No nosso conceito de tempo, ele fala do agora, sendo que o agora representa também ele o futuro. É uma junção dos dois tempos no meu discurso e preocupações.

Já para Baudrillard, a sociedade vive em função do consumo, e por isso os objetos adquirem uma realidade diferente daquela que deveriam ter. Este pensador considera a linguagem dos signo, com as diferentes funções que atribui aos objetos, muito complexa, ou seja, os objetos passam a ter diferentes valores: o valor de uso, o valor económico e o valor simbólico. Este último valor é o que vai dar o mote para a escrita do livro Simulacros e Simulações.

Assim, no momento em que Baudrillard aponta para esta teorias, considera que a sociedade já está envolvida completamente pela simulação, isto é, a realidade já não existe tal como ela é, mas sim de acordo com os vários significados a que já foi sujeita, vivendo a sociedade numa hiper-realidade.

Para este filósofo a humanidade já só existe no campo da hiper-realidade, não distinguindo, por isso, a verdade daquilo que é “impingido” pelos meios de comunicação.

De facto, Baudrillard não parece refletir sobre o que acontecerá no futuro, pois considera que a comunicação no mundo digital é tão abundante, que provoca o desconhecimento, levando à dificuldade em distinguir o verdadeiro do falso. Ainda assim, Baudrillard parece apontar para o facto de que o mundo se adaptará e desenvolverá na hiper-realidade.

Dito isto, não parece líquido que um ou outro dos autores possa ser apelidado de pessimista ou otimista.

Parece, de facto, claro que Baudrillard considera que o novo mundo tecnológico, no qual integra tudo o que, de alguma forma, fixa a realidade, se autonomizou, não sendo já alterado pelo olhar do sujeito que vê/observa, mas antes passa a agir sobre este último, sendo que é o Homem que vive num mundo virtual, porquanto é a máquina que nos representa (veja-se a forma como filmes como Matrix e Avatar aproveitaram esta ideia).

Ainda assim, chega a atribuir a tudo isto um certo caráter poético, na medida em que se nota que o mundo da representação virtual se transforma numa linguagem própria, que se estende como uma rede sobre os sujeitos que toca.

Na verdade, assiste-se tanto em Baudrillard assim como em Virilio à crítica, ainda que diferente em cada autor, sendo que ambas observam o impacto do simbólico na percepção da realidade.

( Trabalho de grupo da equipa Beta: Anderson Morgado, Domingos Nunes, Liliana Silva e Sofia Cabrita)

Referências

Neto, A. (2003. Estaríamos caminhando para a implosão do espaço-tempo e para a desrealização? Algumas implicações das teorias de Jean Baudrillard e Paul Virilio sobre o virtual para a educação/educação física. Recuperado de )https://www.efdeportes.com/efd64/virtual.htm

Silva, J. (2017). O pensamento sem dissimulação. Recuperado de https://repositorio.pucrs.br/dspace/bitstream/10923/14323/2/O_pensamento_sem_dissimulacao.pdf

O mundo sem Baudrillard (2007). Gazeto do povo. Recuperado de https://www.gazetadopovo.com.br/caderno-g/o-mundo-sem-baudrillard-ae7i9km2wnexpnacux0lh26oe/

Serra, P. (1999). Informação e sentido, notas para uma abordagem problemática do conceito de informação. Recuperado de https://ubibliorum.ubi.pt/bitstream/10400.6/517/1/serra-paulo-informacao_e_sentido.pdf

Sodré, M. e Paiva, R (s. d.). Um pensador essencial da comunicação. Recuperado de https://revistas.utp.br/index.php/i/article/view/36/28

Baudrillard, J (1999). Simulacros e Simulações. Lisboa, Relógio de Água

Santos, G. S. (15 de junho de 2011). Entrevista ao filósofo francês Paul Virilio. Diário Liberdade. Recuperado de https://www.diarioliberdade.org/index.php?option=com_content&view=article&id=16682:entrevista-ao-filosofo-frances-paul-virilio&catid=99:batalha-de-ideias&Itemid=113

Lopes. N. e Escola, J. (2009). A Sociedade dos media: Comunicação e Tecnologias da Informação e Comunicação em Paul Virilio". Recuperado de  https://www.researchgate.net/publication/291505858_A_Sociedade_dos_media_Comunicacao_e_Tecnologias_da_Informacao_e_Comunicacao_em_Paul_Virilio

Covas, A. (s. d.). Paul Virilio: Os tempos que o tempo tem. Recuperado de https://observador.pt/opiniao/paul-virilio-os-tempos-que-o-tempo-tem

Coelho, C. A comunicação virtual segundo Lévy e Baudrillard- intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXIV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Campo Grande – MS